FILMEterapia: “O Milagre da Cela 7” Como os Preconceitos Interferem Em nossa vida?



O Milagre da Cela 7 Netflix

Por Vanderli Pantolfi


BREVE RESUMO DO FILME:

*(Se você já assistiu, pule para abordagem psicoterapêutica)

 No longa, em 1983, Memo(Aras Bulut Iynemlivive em um pequeno vilarejo na Turquia com a filha, Ova (Nisa Sofiya Aksongur) e a avó, Fatma (Celile Toyon Uysal). É uma pequena família, que apesar da deficiência mental de Memo, é muito unida pelo respeito e amor.

 O filme como a se desenrolar no momento que Memo se envolve em um acidente fatal para a menina, Seda, colega de escola de Ova e filha de um importante comandante do exército e sem ao menos investigarem o fato corrido, acusam de imediato Memo de assassinato que resultará para ele o enforcamento. Sem intelecto necessário para se defender, ou entender o que acontecia com ele, Memo é dramaticamente afastado da família, sem que a avó possa ao menos explicar a deficiência do neto.  Começa assim um grande drama para Memo. Vemos esse homem com idade mental de uma criança ser espancado covardemente pelo suposto crime que não cometeu e que nos causa emoções dúbias de compaixão para esse personagem, assim como revolta por aqueles que comentem essa violência e injustiça.


 No decorrer do filme, Memo passa a se relacionar com seus colegas de prisão, que antes o taxaram de idiota, mas com o convívio direto quebra o preconceito sendo ele quem é, servindo-os com amor e alegria, apesar de nem entender porque esta ali, afastado da família. Acaba por conquistar a todos principalmente o Askorozlu (Ilker Aksum), um mafioso que passa a confiar em Memo quando ele salva-o de uma tentativa de assassinato dentro do presídio. Como retribuição, Askorozlu consegue, por intermédio de dois, trazer Ova para a Cela promovendo um comovente encontro entre pai e filha que tocam os corações de todos na cela (arranca lágrima de todos nós) e que passam a acreditar na inocência de Memo. Um sentimento de união com certa revolta pela injustiça contra Memo começa a unir todos os companheiros de cela para ajudarem Memo.

 


Durante a visita da menina, Askorozlu diz a Ova que ali é um hospital e que todos eles têm doenças. Ela então, muito inteligente, começa a questionar a doenças de cada um. Na cena, Yusuf (Mesut Akusta) diante de Ova a lhe perguntar qual a sua doença, ele se sente mais culpado ainda por um misterioso crime que cometeu no passado, ao que parece ser de ter matado a própria filha, e o encontro emocionante de Ova com o pai lhe trouxe de volta mais emoções doloridas.  Tempos depois, como sempre martirizado pela culpa, conversa com o prisioneiro Hafiz, que é uma espécie de mentor espiritual da cela, que o aconselha  a ajudar outras crianças e assim encontrará a paz.  Depois dessa conversa, toma uma decisão que comunica a Hafiz e este comunica a todos os outros companheiros de cela, que vai mudar totalmente o destino de Memo.

 



Há uma união de forças dos companheiros de cela de Memo, assim como do Diretor Nail (Sarp Akkaya) que convence o guarda da prisão Faruk (Deniz Celiloglu) da inocência de Memo, logo após saber que a única testemunha que poderia salvar Memo do enforcamento foi executada pelo comandante, pai da menina morta, com a desculpa que ele tentou fugir. Assim no dia do enforcamento, Faruk organiza uma confusão no presídio e chama atenção dos outros guardas para setores distantes da cela, enquanto que os dois amigos de Askorozlu (os mesmos que trouxeram Ova para o encontro com o pai na cela) causam um acidente com o carro do comandante que estava indo para a execução de Memo, eliminando assim testemunhas que poderiam ver o que realmente aconteceu no presídio naquela noite.

 Memo se despede dos companheiros numa cena de muita emoção, porém no caminho para o local da forca, ele é trocado por o Yusuf que pediu para ser executado no lugar dele, acreditando assim, acabar com sua culpa e ao mesmo tempo ajudar um inocente devolvendo- o a filha, cumprindo a sua decisão de ajudar outra criança se redimido do crime praticado, e é executado no lugar de Memo. Yusuf, depois dessa noite é considerado desaparecido, fugitivo, como se houvesse escapado no caos da noite da execução, e todos pensam que Memo foi executado.

 



Logo após o enforcamento de Yusuf, Nail leva Memo escondido num carro até Ova e a entrega a única lembrança que o prisioneiro deixou para trás, uma cigarreira: “O homem que lhe enviou isso também te enviou seu pai”, diz o diretor para a criança. Ele, e o guarda colocam Memo e Ova num navio para começarem uma nova vida com novos nomes em outro pais.

 ASSITA O VÍDEO ABAIXO:                                                 


ABORDAGEM PSICOTERAPÊUTICA

Vamos à abordagem psicoterapêutica, para tanto esclareço que a minha intenção aqui não é julgar os personagens, mas sim, trazer a experiência do filme pra mim, e que você traga pra você diante de tudo que vamos abordar agora. Portanto, destaquei as seguintes observações a serem trabalhadas por nós no contexto:


  1. O preconceito já concebido em tenra idade e exacerbado na idade adulta:

    Logo no início do filme, vemos o preconceito já concebido em tenra idade pelos colegas de escola de Ova em relação a seu pai chamando-o de idiota, causando na menina tristeza e questionamento sobre a diferença de seu pai com outros pais. Mais além, a reação dos soldados e dos prisioneiros da cela diante da deficiência mental e cognitiva de Memo.     Façamos uma reflexão. Como nos sentimos sendo preconceituosos? O que nos incomoda no outro para agirmos desse jeito com as pessoas? E como vítimas como nos sentimos diante desse comportamento para conosco? Acredito que o preconceito foi concebido na fase infantil, de criação da personalidade, criado por crenças familiares, religião, cultura e sociedade. A maioria desses comportamentos é gravada em nosso inconsciente, portanto, manifestado de forma emocional e raramente racional. Assim sendo, tanto vítima como algoz precisam de tratamento, porque o preconceituoso esta sempre incomodado, se assim está não esta em paz e feliz.

  2. Intolerância com pessoas diferentes de nós o que fazemos com isso?

    A Intolerância com Memo do comandante, pai de Seda, a colega de escola de Ova simplesmente por ele ser deficiente mental e provavelmente também por ser de uma classe social mais baixa. Isso fica claro no momento que o comandante bate em Memo. Logo depois vemos a tristeza da filha pela humilhação que o pai sofreu, e o que nos surpreende é a única preocupação de Memo é que se a filha vai voltar a sorrir.  A avó lhe diz sim, e que ele não se sinta diminuído, porque ele não é diferente de ninguém, ele tem mais e não menos, um coração lindo.  E nós, como nos comportamos diante de situações similares, ocupando hora o lugar do comandante, hora o lugar de Memo, de Ova ou da avó? Pense nisso! 

  3. A dor e reações diante de uma tragédia:

    O comandante diante da tragédia, de sua dor inimaginável reage a atacar àquele que acredita ser o causador de sua dor, de sua perda, tentando inclusive matar Memo, ao sacar o revólver do colega que o tentava dominar em sua fúria. Como telespectadores, pra nós é um absurdo, mesmo porque sabíamos o que aconteceu diferente dele, que somente viu aquele quadro e imaginou os fatos. Dessa forma, quem somos nós a condenar esse pai no limite da sua dor e das emoções?  São momentos que não se espera na vida, assim sendo são difíceis de imaginar nossas reações, porque trazemos emoções inconscientes diante de uma situação como essa. Nesses momentos ativamos nosso sistema simpático, que libera no sangue adrenalina e outras substâncias que nos fazem reagir à situação, seja fugindo para nos defender, ou atacando como foi a reação do comandante. Assim sendo, é necessário que possamos cada vez mais buscar o autoconhecimento, mergulhando em nosso inconsciente para trazermos cada vez mais às emoções a luz da razão para que possamos evitar mais sofrimentos. Olhando Memo, no contexto da cena, o “algoz” é tanto vítima como a criança, mais ainda porque nem consegue se defender como muitos de nós que já estivemos nessa situação, e mesmo com o intelecto normal, nem sempre conseguimos provar nossa inocência, nos causando dor e sofrimentos.

  4. A injustiça diante da dualidade legal/moral como lidamos com isso?

    É legal, mas imoral: Covardemente Memo é espancado e nem teve direito a uma investigação, ou defesa, já foi logo condenado a prisão e a morte por enforcamento, afinal era culpado, é a lei! Mas, será que ninguém ali era capaz de ver a deficiência do rapaz? Isso não era importante. A menina morreu e ele era o culpado. Assim o próprio comandante o espanca também, liberando a raiva da perda com a agressão àquele que acredita ser o assassino de sua filha. É moral, mas ilegal: No final quando todos, os prisioneiros, inclusive o diretor da Cadeia, junto ao guarda e a professora faz uma trama ilegal, mas totalmente moral para libertar um inocente e devolvê-lo a sua filha contribuindo para a felicidade de ambos. Aprendi no seio familiar desde cedo a fazer as coisas certas, a seguir a lei e os costumes. Aprendi que todos nós temos o direito à defesa e sempre se devem ouvir as duas partes envolvidas. Porém, nem sempre é isso que acontece na sociedade, nem tudo o que é legal é moral, porque pelo egocentrismo de alguns indivíduos há favorecimentos e injustiças. Você já viveu uma situação de injustiça? É necessário saber como você se sente diante de questões como essa. E o mais importante, o que você faz ou esta fazendo com isso? Saiba que sua resposta é que determina seus tormentos ou sua paz.

  5. A chegada de uma pessoa em determinado local vem somar ou dividir?

    Quando Memo chega ao presídio e é tratado com preconceito pelos guardas e prisioneiros em geral inclusive os da sua cela. Somente com o convívio, com sua inocência, suas obras, o companheirismo, o encontro com Ova, que todos puderem conhecer de verdade a essência linda de Memo e ele conquistou a todos. Essa é uma situação que nenhum de nós escapa. Sendo o novato ou recebendo o novato, já tivemos e teremos sempre essa situação a experenciar. Assim sendo, como você se comporta em cada papel? Você é uma pessoa que vem pra somar ou dividir na ambiente que chegou? Você aceita ou rejeita um estranho? Memo foi hostilizado, mas seu cognitivo não lhe permitia perceber, por isso continuou sendo quem ele é. Um grande exemplo a seguir, afinal você jamais deve mudar sua essência para agradar a outrem, as pessoas o aceitarão como você é!

  6. A projeção de culpar alguém, mesmo sabendo que a pessoa é inocente.

    Quando mesmo aparecendo uma testemunha inocentando o Memo, o comandante além de não aceitar, mata a testemunha, apenas porque tinha que arrumar um culpado pela sua perda. Em determinados momentos de nossa vida, estamos tão machucados que também só queremos ferir, mesmo tendo a total consciência que a pessoa é inocente. Por que agimos assim? Justamente porque estamos feridos e não adquirimos maturidade moral para entender que a dor é nossa e o outro não tem nada a haver com isso. Porém isso ficará anotado na contabilidade moral de nossa mente, e um dia teremos que resolver como aconteceu com Yusuf ao se oferecer para o enforcamento numa tentativa de se redimir. Por isso estou sempre a orientar as pessoas e clientes: “Não importa o que a vida fez com você, o que importa é o que você vai fazer com isso? Porque tudo tem conseqüências!

  7. A gratidão por algo que alguém faz por nós.

    Bem claro quando Memo sem intenção nenhuma salva a vida de Askorozlu. Ele por sua vez tem a gratidão pelo ato e faz tudo para recompensar, porém nesse movimento ele próprio quem se beneficia a ter uma olhar mais amoroso pela própria família que reage da mesma forma.  O que estamos fazendo ao próximo num momento tão delicado como o que estamos vivendo atualmente? Lembrem-se, tudo que fizermos voltará pra nós, é uma lei “ação e reação”!

  8. A união que faz a diferença.

    Quando a filha, a professora, o diretor do presídio, o guarda chefe e os prisioneiros perceberam a inocência de Memu, se uniram em prol de sua liberdade e a união fez a grande diferença, cada um cooperando como podia, principalmente para Yusuf que deu a própria vida em prol do amor de pai e filha, claro que tentando se redimir de sua culpa, porém, é necessário que se diga que ele teve muita coragem e honra. É necessário destacar também a coragem do diretor e o guarda do presídio, por estarem incorrendo em crime e perderem o próprio emprego. 

    Dito isso, o que podemos fazer em prol da felicidade de alguém? Sugiro que comece por você, porque só poderá dar quem tem para dar, porém, nada te impede que nesse caminho seja sempre gentil, útil, leve, alegre, usando de respeito e carinho para com todos, inclusive os mais próximos.




Vanderli Aparecida Pantolfi da Costa é Palestrante, Psicanalista
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